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Artigo Sexta-feira, 29 de Setembro de 2017, 00:00 - A | A

29 de Setembro de 2017, 00h:00 - A | A

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'Lado B' da delação



Embora não seja novo no nosso Direito, é fato que o instituto da “delação premiada” passou a ser muito utilizado somente após a regulamentação que lhe foi dada pela Lei 12850/2013.
Há um sentimento comum de que as incontáveis operações da Polícia Federal ( principalmente, a Lava-Jato) não teriam chegado aos resultados que alcançaram sem a “colaboração” dos inúmeros delatores.
Realmente, é inegável que o combate à corrupção teve na “colaboração premiada” um importantíssimo aliado. Afinal, foi por conta das delações que o Estado brasileiro conseguiu recuperar bilhões de reais que tinham sido desviados dos cofres públicos. A sociedade passou a presenciar figurões do “alto escalão” político e grandes empresários sendo encarcerados e processados criminalmente.
Em meio aquele sentimento inicial de euforia e satisfação, a sociedade brasileira, cansada da folia feita com o dinheiro público, a tudo aplaudiu. Contudo, paralelamente aos aplausos e às sucessivas operações da Polícia Federal, a legalidade, o respeito irrestrito à Constituição e, principalmente, os direitos e garantias constitucionais dos investigados acabaram ficando em um segundo plano.
Por conta da sanha punitivista que domina o espírito da nossa sociedade, o interesse do “coletivo” passou a ser mais importante do que a defesa dos direitos processuais dos envolvidos.
Entretanto, na esteira do que alguns operadores do Direito já alertavam ao tempo em que as delações pululavam pelo país, sempre é preciso ter cuidado com aquilo que falam os “réus colaboradores”, afinal, como bem se sabe, quem delata é tão “criminoso” quanto os delatados. Era evidente que, em algum momento, a “delação premiada” iria revelar o seu lado obscuro, até então desconhecido.
De fato, sobretudo a partir do instante em que empresários de um grande conglomerado industrial, porque resolveram delatar e cooperar com a apuração de crimes que envolviam o alto escalão da República, viram-se livres e integralmente perdoados de todos os seus ilícitos, aquela mesma sociedade que a tudo aplaudia, já não conseguiu mais compreender o que estava se passando. Ao cabo de contas, como entender que réus confessos, supostamente envolvidos com inúmeras práticas delituosas, simplesmente conseguiram uma autorização para deixar o País, como se nada devessem às autoridades e à Justiça?

não são poucos os que o consideram como uma indispensável ferramenta de investigação e de combate ao crime

Nesse instante, a “delação premiada”, antes tida como poderoso instrumento de investigação, passou a ser tratada como uma possível fonte de impunidade.
Esqueceram-se os críticos, porém, que aquele acordo foi realizado dentro dos estritos limites da lei, tanto que acabou sendo integralmente homologado pelo STF.
É preciso dizer que o tamanho do benefício concedido ao delator está intimamente relacionado ou à magnitude dos crimes por ele revelados ou, então, à importância dos delatados no cenário político/econômico nacional.
É forçoso reconhecer que, em virtude das informações, fatos e provas inicialmente apresentadas, o “perdão” concedido para aqueles grandes empresários não tinha nada de anormal, nem, tampouco, de ilícito.
Aquele acordo, embora formalmente lícito, foi muito útil para mostrar à sociedade o “lado B” da “delação premiada”, vale dizer, a faceta obscura e negativa daquele instituto. Ficou comprovado, portanto, que, tal qual se dá no Direito Americano, a mesma delação, que justifica a prisão de diversos investigados, é também capaz de motivar a concessão de um “perdão integral” a quem comete crimes, vale dizer, promover a impunidade do delator.
Com efeito, por conta de uma gravação altamente comprometedora, cujo conteúdo atinge importantes Instituições e personagens da Nação, aqueles “delatores”, até então imunes à aplicação da lei, caíram em desgraça.
Apesar do tom “bravateiro” daquela conversa, está claro que ela atinge pessoas importantes, bem como joga terra por cima de integrantes do MPF.
Foi a partir daí, portanto, que o Estado passou a promover uma clara tentativa de calar o “delator”, até então tido como “intocável”, para assim evitar que possíveis bravatas ganhassem força e produzissem efeitos explosivos no seio do poder.
Mais do que depressa, o “colaborador” até então “protegido” foi encarcerado, jogado aos leões da mídia e da opinião pública e, agora, a delação premiada por ele celebrada está em xeque, já que, caso seja anulada, perderá todos os benefícios que lhe haviam sido “prometidos”. 

Euro Bento Maciel Filho é advogado e professor de Direito Penal e Processo Penal

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