Assessoria de Comunicação/ICV
Apesar dos esforços do governo para reverter a curva do desmatamento, a falta de transparência de dados em metade dos estados brasileiros impede a correta identificação do desmatamento ilegal.
Esta é a principal conclusão do Monitor da Fiscalização, que acaba de consolidar novos dados até os sete primeiros meses de 2023. A ferramenta foi desenvolvida em parceria pelo Instituto Centro de Vida (ICV) e a iniciativa Brasil.IO, a partir de informações da rede MapBiomas.
Dos 27 estados da federação monitorados, 14 divulgam algum tipo de dado em formato adequado ou com informações suficientes, que permitem uma análise de cruzamento com os alertas de desmatamento publicados pelo MapBiomas Alerta. Dos 13 estados com baixa transparência de dados de controle e fiscalização ambiental, dois estão entre os cinco maiores desmatadores do país: Maranhão e Bahia, com 935 e 822 mil hectares entre 2019 e 2023, respectivamente.
Além das bases de órgãos estaduais, o Monitor da Fiscalização também utiliza informações sobre fiscalização disponibilizadas pelo Ibama e o ICMBio, assim como as autorizações de supressão incluídas no Sinaflor. A partir desse conjunto de dados, identificamos que mais de 5,1 milhões de hectares e 293 mil alertas de desmatamento registrados entre janeiro de 2019 e julho de 2023 não estão sobrepostos às autorizações de desmatamento ou ações de fiscalização disponibilizadas publicamente.
Nas 14 unidades da federação que divulgam dados – Acre, Amazonas, Ceará, Distrito Federal, Espírito Santo, Goiás, Mato Grosso, Minas Gerais, Pará, Paraná, Piauí, Rio Grande do Sul, Rondônia e São Paulo – 36% da área dos alertas de desmatamento validados pelo MapBiomas Alerta entre janeiro de 2019 e julho de 2023 possuíam algum tipo de autorização ou uma ação de fiscalização sobreposta aos alertas do MapBiomas. Já, nos outros 13 estados, que contam apenas com dados divulgados por órgãos ou sistemas federais, essa proporção de alertas de desmatamento com autorizações ou ações de fiscalização cai para 14,4%.
A falta de bases de dados sobre a atuação no controle e combate ao desmatamento por parte dos órgãos estaduais dificultam iniciativas que visam separar o joio do trigo. É o caso da iniciativa do BNDES, que em parceria com dados do MapBiomas, impediu mais 300 milhões em crédito rural por conta de alertas de desmatamento sem a devida documentação entre fevereiro e outubro de 2023. A instituição anunciou em 2024 a ampliação de restrições a imóveis rurais com desmatamento. “A transparência ativa de dados governamentais relacionados ao controle do desmatamento é fundamental para uma justa e efetiva avaliação de risco no setor financeiro. O que é embargado, por exemplo, precisa estar público para impedir o benefício econômico com áreas desmatadas ilegalmente”, destaca Marcondes Coelho, analista socioambiental do ICV.
A supressão de vegetação nativa em imóveis rurais no Brasil deve ser previamente autorizada por órgãos ambientais competentes, tais como Ibama, em nível federal, e órgãos estaduais de meio ambiente. Quando não é autorizado, o desmatamento precisa ser fiscalizado e, caso a irregularidade seja comprovada, a área desmatada pode ser autuada e ou embargada. Porém, para uma maior efetividade dessas ações, tais informações precisam estar disponíveis à sociedade. “Se os órgãos de fiscalização, as instituições financeiras e a sociedade em geral não têm acesso a tais informações, é impossível identificar os produtores e produtoras que trabalham na legalidade ou controlar a atuação dos órgãos de fiscalização”, explica Bruna Menani Lima, especialista em dados do Brasil.IO.
“Até a COP30 de Belém, no próximo ano, o governo federal precisa trabalhar em colaboração com os estados para que o Brasil consiga reportar quanto do desmatamento no país é legal e o quanto é ilegal”, afirma Coelho.
Lançamento de Guia de Boas Práticas visa fortalecer a fiscalização
Para incentivar e apoiar tecnicamente órgãos governamentais federais, estaduais e municipais no aprimoramento da transparência de dados ambientais, as instituições que criaram o Monitor da Fiscalização lançaram recentemente o Guia de Boas Práticas para a Transparência de Dados Governamentais sobre Controle e Combate ao Desmatamento no Brasil. O documento traz orientações e boas práticas sobre a disponibilização de dados de autorizações de supressão da vegetação, de autos de infração e embargos por desmatamento, considerando requisitos mínimos de transparência ativa para bases de dados completas e espacializadas.
Para os pesquisadores do Monitor da Fiscalização, a destinação de recursos nos estados para a estruturação e publicação dessas bases de dados é urgente. Órgãos de controle externo também precisam desempenhar um papel na cobrança da transparência ativa. “Somente assim, será possível avançar no efetivo combate ao desmatamento ilegal em três frentes: a da tecnologia, visando detectar e reportar todo desmatamento; a da fiscalização, que deve almejar autuar e embargar todo desmatamento ilegal; e a do mercado, que poderá impedir o benefício econômico das áreas embargadas divulgadas”, detalha Marcondes Coelho.