Carta Z
Regina Casé é bem familiarizada com a fama e o prestígio que tem na Globo. Por isso, para repaginar o “Esquenta!”, a apresentadora recorreu ao alto escalão da emissora para pedir que voltasse às ruas. Conhecida por programas que valorizavam culturas mais interioranas, como “Brasil Legal”, “Muvuca” e “Central da Periferia”, ela sentia o peso de ficar presa no estúdio ao longo dos cinco anos de seu dominical. “O ‘Esquenta!’ foi criado para ser um programa de três meses. Acabou ficando esse tempo todo no ar e não tivemos tempo para repensar no formato. Foi aí que eu pedi um tempo para repensar tudo”, explica Regina. Ao lado do marido, o diretor Estevão Ciavatta, ela percorre diferentes cidades do país atrás de famílias que tenham alguma conexão com o programa.
Filha do diretor de tevê Geraldo Casé e neta do radialista Ademar Casé, Regina cresceu nas areias de Copacabana, Zona Sul do Rio de Janeiro. Mesmo assim, sempre se interessou pela cultura que ia para além do asfalto. Durante os anos 1970, criou o grupo de teatro “Asdrúbal Trouxe o Trombone”, ao lado de figuras como Luiz Fernando Guimarães, Evandro Mesquita e Hamilton Vaz Pereira. Entre humorísticos, novelas, peças de teatro e longas, ela se firmou como apresentadora e passou a levantar a bandeira da cultura popular brasileira. “Hoje a periferia está na moda, mas já falo dela há tempos. Sou rotulada como a apresentadora que só fala de preto, favelado e pobre. Mas, na verdade, tenho liberdade e vontade de falar sobre um Brasil real”, garante.
P – Como foi criado o novo formato do “Esquenta!”?
R – A gente está engatinhando em um formato muito promissor. Acho que daí ainda pode sair muita coisa. Porque é tudo muito imprevisível, o próprio formato vai guiando a gente. No início, a gente não sabia o quanto de auditório teria. E aí optamos por não deixar nada fechado. Os programas vão variando de acordo com o que cada família rende lá no dia. Às vezes, puxa mais para a emoção, às vezes, para a diversão. É um processo muito orgânico que a gente vai medindo na hora. Estamos conhecendo essa nova cara do programa, não quer dizer que agora estamos taxando que ele é “assim”. Pode ser diferente ano que vem, até porque não sei se é viável para a empresa que a gente continue viajando.
P – Quando você percebeu que estava na hora de mexer na estrutura do programa?
R – Para começar, nunca tivemos tempo de parar e pensar em um formato. Fomos vivendo e fazendo o programa direto, sem férias. Foram 174 programas gravados de maneira contínua. Foi uma loucura. E a equipe precisava dar uma renovada, uma animada. Estamos juntos como equipe, redação, direção e pesquisa há muito tempo. E é uma galera que está acostumada com essa pegada documental, de achar personagens e ir atrás de histórias. Estávamos morrendo de saudade de viajar, mas, ao mesmo tempo, estamos felizes de não termos abandonado essa conquista que é ter um programa de auditório.
P – E como é feita a medida do tempo dentro do estúdio e fora dele?
R – Essa é a única coisa que temos assim, escrito em pedra. Com a família da vez selecionada, vamos para o estúdio e gravamos, já com as músicas e convidados. Depois disso, colocamos o programa na mala e vamos viajar. E aí a gente assiste ao programa junto com a família. Isso era o que a gente já sabia, foi a ideia inicial. O que vem depois daí é mistério mesmo. Mas já aconteceu, uma vez, de a gente ter de voltar para o estúdio depois gravar alguma coisa que a família pediu, como uma música.
P – Sobre o processo de pesquisa e a escolha das famílias, como você pensou nessa questão?
R – Algumas famílias se inscreveram no site, outras nossa equipe viajou até alguns lugares que achamos importante estarem retratados no programa. Queríamos que as cinco regiões do país estivessem ali e, claro, com religiões diferentes, modelos de vida diferentes, configurações familiares diferentes... E foi engraçado isso, porque, em um primeiro momento, não pensamos necessariamente em famílias. Imaginamos mais grupos de pessoas, sem ter essa prerrogativa de ser uma família. Só que, talvez pelo horário do programa, que pega o almoço de domingo, a maior parte das inscrições e da procura foi de famílias.
P – Desde o “Programa Legal”, de 1992, suas produções na tevê são bem autorais e têm muito apelo popular. Essa nova fase do “Esquenta!” bebe na fonte do seu passado?
R – Com certeza. A cada programa a gente vai procurando uma correspondência do que a gente já fez. Tem um lado “Muvuca”, “Brasil Legal”, “Central da Periferia” e até “TV Pirata”. Vai tudo incorporando. E assim a gente consegue atingir cada vez mais gente. Não tenho dúvidas que o “Esquenta!” é o meu programa mais abrangente em questão de público.
"Esquenta!" – Globo – Domingos, às 13h45.