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Artigo Sexta-feira, 20 de Dezembro de 2019, 00:00 - A | A

20 de Dezembro de 2019, 00h:00 - A | A

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ICMS: A CRIMINALIZA



 

 Por maioria de votos-6x3 até o momento- o Supremo Tribunal Federal no julgamento do RHC 163334-SC, entendeu que o não pagamento do ICMS declarado pelo contribuinte ao fisco estadual pode caracterizar o crime contra ordem tributária previsto no inciso II do art. 2º da Lei 8.137/90, in verbis:

Art. 2° Constitui crime da mesma natureza:

I – omissis;

II – deixar de recolher, no prazo legal, valor de tributo ou de contribuição social, descontado ou cobrado, na qualidade de sujeito passivo de obrigação e que deveria recolher aos cofres públicos; (g.n.)

O crime tipificado no art. 2º em comento não é o de sonegação, que é a não declaração do imposto. Aqui a empresa -sujeita passivo da relação- declara o imposto ao fisco, mas não o recolhe aos cofres públicos.

Em breve histórico, o caso iniciou-se no ano 2016 no município de Brusque-SC, tendo o Ministério Público ingressado com ação penal contra um casal de empresários –donos de uma loja de produtos infantil-, por haverem estes declarados e não pagos o ICMS relativos a períodos de 2008 a 2010, totalizando à época cerca de R$ 30.000,00 (trinta mil reais) e, mesmo tendo aderido a 3(três) parcelamentos, não quitou os impostos. O Juiz do caso entendeu que a conduta era atípica – ou seja, não era crime- e absolveu o casal sumariamente (sem a realização de audiência e de demais atos processuais penal).

O Ministério Público de SC recorreu ao Tribunal de Justiça de SC, entendendo estes que a conduta dos empresários poderia caracterizar crime contra a ordem tributária e assim anularam a sentença absolutória do juízo de 1ª instância, determinando que fosse dado regular andamento ao processo.

 Inconformados, os empresários recorreram ao STJ que por sua vez, também por maioria de votos (HC 399.109-SC), entenderam que a conduta de não pagar o ICMS declarado pode caracterizar crime tributário.

Importante ressaltar que no STJ, as duas Turmas Criminais (5ª e 6ª) -com 5(cinco) Ministros cada-, tinham posicionamentos divergentes sobre o tema. Via de regra a 6ª Turma entendia que somente o não recolhimento do ICMS-ST configuraria crime contra ordem tributária. A 5ª Turma por sua vez, entendia que independente da forma, o não recolhimento caracterizaria crime. Originalmente o HC 399.109-SC foi distribuído a 6ª Turma, porém objetivando unificar o entendimento sobre o tema, o HC foi afetado, sendo então julgado pela 3ª Seção, que é a reunião dos Ministros das 5ª e 6ª Turmas.

A Defesa recorreu a Suprema Corte (STF) - RHC 163334/SC- buscando o reconhecimento da atipicidade da conduta e mantença da sentença de absolutória de 1ª instância, em seus termos. Como dito anteriormente, o STF por maioria de votos, assim não entendeu.

Porém, dos votos proferidos pelos Ministros do STF, em especial do Ministro Relator Dr. Luiz Roberto Barroso, extrai-se importante lição a ser observada por empresários, advogados e contadores.                      

É certo que o crime tipificado no art. 2ª da Lei 8137/90 tem como elemento subjetivo o dolo, ou seja, a vontade livre e consciente de não recolher o imposto aos cofres públicos. Em outro giro, o imposto não pago por insuficiência de recursos financeiros não caracteriza crime: A exemplo das situações vivenciadas em tempo de crise quando é frequente a opção de pagamento da folha ou fornecedores em detrimento do recolhimento do imposto.

Em seu voto o Min. Relator Luiz Barros exemplificou comportamentos que podem ser considerados como conduta dolosa da empresa, incidindo assim no crime tipificado no inc. II do art. 2º da Lei em comento, sendo eles:

  • venda de produtos abaixo do preço de custo (valor de compra+encargos tributários);
  • inadimplências reiteradas;
  • criação de obstáculos a fiscalização;
  • utilização de laranjas;
  • ausência de tentativa de regularização do débito tributário;
  • criação de diversas empresas;
  • encerramento irregular da empresa, com abertura de outras empresas.

Deve-se observar ainda que a SEFAZ tem total acesso ao Speed Fiscal, bem como possui prática reiterada de notificar o contribuinte para apresentação de documentação a exemplo de extrato bancário, livro fiscal, livro caixa, etc., principalmente das empresas optantes do simples nacional.

Com este arcabouço de documentos, aliados as situações acima elencadas, não é difícil o órgão acusador -Ministério Público- entender pela caracterização do dolo no não recolhimento do imposto e,  ingressar com a ação penal contra os sócios da empresa e/ou seu representante legal.

Desta feita, restará ao(s) empresário(s) provar a incapacidade do pagamento e, esta prova se dá a nível técnico, especialmente pela contabilidade da empresa e seu(s) extrato(s) bancário(s).  Portanto, passem a cuidar com maior carinho da área contábil. Não raras vezes, aos perguntarmos aos clientes que ingressam no escritório como está a contabilidade da empresa, nos deparamos com respostas altamente preocupantes: “não sei, não entendo disto” ou; “não sei, tem que ver com o contador”. Conhecer a saúde contábil de sua empresa é fundamental e obrigatório a todo empresário.

Importante ressaltar ainda, duas situações: o parcelamento do débito tributário antes de oferecida a denúncia (ação criminal) suspende a prescrição do crime e veda o ingresso da ação, enquanto o parcelamento estiver vigente. Já o pagamento integral, mesmo com a existência da ação penal e até mesmo após o trânsito em julgado de eventual sentença condenatória, extingue a pretensão punitiva do Estado. É o entendimento do STF, posto que a Lei 12.382/11 convive de forma harmônica com a Lei 10.684/03 (HC 362.478/SP).                 

Temos que a decisão do STF na criminalização do não recolhimento do ICMS deve, infelizmente, incentivar os Estados a ingressar com ação penal contra os contribuintes, não com o objetivo primário de frear tal prática ou mesmo de punir, mas de saciar a sede arrecadatória do Estado.

 Por fim, vale observar que de igual forma a decisão do STF também se aplica ao imposto sobre serviço (ISSQN), o que pode levar o paço municipal a adotar tais medidas.

 

Autoria

Joel Quintella – Advogado

OAB-MT 9.563

Sócio da Quintella & Mello Advogados Associados

Dezembro/2019

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