com Hernando Calaza
Autocosmos.com/Argentina
Exclusivo no Brasil para Auto Press
Muito antes dos SUVs de hoje entrarem na moda, com suas arquiteturas em monobloco e capacidade off-road limitada, os veículos off-road tinham carroceria apoiada em chassi de longarina e normalmente tinham estruturas compartilhadas com picapes. Nesse conceito, há no mercado brasileiro apenas três modelos: Toyota SW4, Chevrolet Trailblazer e Mitsubishi Pajero Sport, todos com sete assentos e baseados, respectivamente, na Hilux, na S10 e na L200. Para experimentar esse nicho na Argentina, a Ford passou a importar da Tailândia o SUV Everest, oferecido por US$ 80 mil – ou cerca de R$ 400 mil. Ele é baseado na Ranger, mas tem uma diferença fundamental em relação aos rivais: é animado por um motor Ecoboost 2.3 a gasolina.
Apesar de um certo assanhamento na mídia, há poucas chances desse modelo ser vendido no Brasil. E o motor Ecoboost 2.3 é um o principal motivo. Para aceitar o combustível E30 brasileiro, seria necessário um trabalho de adaptação pela engenharia da marca – um custo que dificilmente de pagaria com o nível baixo de vendas que a Ford tem obtido no Brasil. Além disso, essa família de motores tem problemas crônicos. Ele tem apresentado trincamento do bloco, que permite a passagem de líquido de arrefecimento para a câmara de combustão, o que pode condenar o motor. E em geral a Ford não assume o problema como vício de origem, e não indeniza o consumidor. No Brasil, está presente no News Fiesta, Fusion, Edge, Bronco Sport e picape Maverick.
O motor Ecoboost 2.3 entrega 300 cv de potência com 45,5 kgfm de torque e é gerenciado por um câmbio automática de 10 marchas – o mesmo do Mustang e da Transit, produzido em parceria com a General Motors. Ele ainda traz diversos recursos que aumentam sua habilidade para o off-road, como 4X4 com reduzida, capacidade de imersão de até 80 cm e distância para o solo de 22,6 cm. Já os ângulos de ataque, com 30,2º, ventral, com 21,9º, e de saída, com 25º, não impressionam, mas podem ser considerados bons para um veículo grande, com 4,91 metros de comprimento e distância entre-eixos de 2,90 m.
Apesar de grande, é menor que a Ranger. É 45 cm mais curto e tem entre-eixos 37 cm menor. Como se trata de um modelo de sete lugares, o espaço na terceira fileira e o porta-malas são limitados. Com os sete lugares, tem 259 litros para bagagem, que sobe para 898 litros com cinco passageiros e 1.823 litros com as duas fileiras rebatidas. Outras diferenças em relação à Ranger é a ausência da distribuição inteligente entre os dois eixos. Além do 4X4 com reduzida, traz apenas tração 4X2 na traseira e bloqueio do diferencial traseiro que divide igualmente a força entre as duas rodas.
Já o visual até a coluna central tem um compartilhamento completo com a Ranger. São iguais no capô, nas luzes full LED, nos para-lamas e nas portas dianteiras. A mudança mais notável está na parte inferior do para-choque. As diferenças substanciais começam na coluna entre as portas em direção à traseira. Aí mudam teto, porta traseira, terceira coluna inclinada com moldura preta e janela lateral traseira com moldura cromada. A tampa do porta-malas é bastante simples, com linhas ligeiramente arredondadas. Ela traz lanternas horizontalizadas conectadas por uma guarnição em preto brilhante.
Por dentro, o Everest traz um painel praticamente idêntico ao da Ranger, com decorações em preto piano, uma espécie de madeira escovada, luz ambiente azul e um pouco de couro na parte superior. Uma grande diferença com a Ranger fabricada na Argentina são os porta-copos, que saem das laterais, e a ausência da bandeja aberta entre os dois porta-luvas. A central multimídia é a mesma da Ranger, com tela grande e vertical, sem navegador interno, mas com espelhamento através de Apple CarPlay sem fio e Android Auto com fio.
O painel de instrumentos digital tem tela de 8 polegadas – bem menor que a de 12 polegadas da Ranger Limited+. Ainda assim, é configurável, tem boa leitura e traz diversas páginas com informações pertinentes como temperatura da água, autonomia etc. O Everest traz ainda ar-condicionado duplo com saídas para a segunda fileira, sensores de estacionamento dianteiros e traseiros, bancos dianteiros de couro aquecidos e com ajuste elétrico, teto solar panorâmico, porta traseira motorizada e terceira fila de bancos.
Na parte de segurança, o Ford Everest fica abaixo da expectativa. Ele tem seis airbags, manutenção de faixa sem centralizador – que exigiria esterçamento do volante – sensor de ponto cego, alerta de colisão com frenagem autônoma, monitoramento da pressão dos pneus e alerta de tráfego cruzado traseiro. Faltam, no entanto, itens bastante desejáveis – ainda mais em um modelo que custa US$ 80 mil, como controle de cruzeiro adaptativo.
Impressões ao dirigir
Pouco por muito
Uma vez na cabine, atrás do volante, o Everest oferece ajuste elétrico do assento e regulagem de altura e profundidade do volante. Os espelhos são enormes e há sensores, câmeras e alertas para auxiliar as manobras de um veículo com quase 5 metros. A grande diferença vem em relação aos rivais, todos movidos a diesel. Ao pressionar o botão de partida, o Ecoboost 2.3 dá partida sem vibrações e com um som baixo.
A alavanca de marchas é do tipo manopla. O Everest se põe em movimento sem deslizamento do conversor e a caixa vai constantemente vasculhar entre suas 10 marchas de forma imperceptível. Como costuma ocorrer nesse tipo de arquitetura, de carroceria sobre longarinas, é ter um comportamento mais áspero, mais lento e mais pesado. A direção e o freio, com discos nos quatro cantos, não são tão diretos. A carroceria rola um pouco mais do que devia, principalmente em curvas fechadas ou frenagens bruscas.
O motor 2.3 litros empurra bem o Everest. Tanto que a retomada de 80 a 120 km/h é feita em 6,2 segundos. O zero a 100 km/h é cumprido em 8,6 segundos – nada mal para um veículo com 2,4 toneladas de peso. Para dar mais autonomia ao modelo, a Ford instalou um tanque de 80 litros, que permite rodar 537 km com gasolina argentina na cidade – pouco abaixo de 7 km/l.
O motor a gasolina, apesar de ser menos eficiente que o diesel, tem a vantagem de vibrar menos e ser mais silencioso. Na estrada a 120 km/h, ele gira a 2 mil rpm. Além disso, a cabine é bem insonorizada. A estabilidade é boa, mas não gosta de desvios bruscos – deve-se levar em conta que é um veículo alto e pesado. Além da pouca confiabilidade do motor Ecobbost, no fim das contas, faltam equipamentos e tecnologia ao Everest, como requinte no acabamento interno, controle de cruzeiro adaptativo e um diferencial central para que a distribuição da força entre os dois eixos para funcionar como um AWD – só que possível usar o 4X4 em pisos de baixa aderência.