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Entrevistas Domingo, 06 de Novembro de 2022, 20:43 - A | A

06 de Novembro de 2022, 20h:43 - A | A

Entrevistas / Consolidação das Leis do Trabalho

Acabou a política de um manda e todos obedecem



IstoÉ Dinheiro/ Beto Silva 

Claudia Woods, CEO da WeWork na América Latina, participa de conselhos e reuniões com executivos de empresas de todos os tamanhos — de pequenas a bigtechs. E revela que o debate sobre a necessidade de revisar o regime da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) virou pauta crítica nas mesas. “Antes, era um assunto muito tático. Hoje, virou estratégico, relacionado a engajamento, atuação e retenção”, disse a executiva. Sua companhia, que no Brasil está em oito cidades, com 32 prédios, tem se adaptado à nova realidade e lançado produtos para atender demandas em transformação.  

DINHEIRO – A empresa está no Brasil desde 2017. Como foi essa jornada?

CLAUDIA WOODS – Naturalmente, a empresa começa com esse conceito do espaço compartilhado. Passamos anos assim, tentando solidificar esse modelo de escritório. Hoje a gente observa que o coworking evoluiu para o flexível, com várias definições. Qual o maior impacto do período da pandemia?

Somos duplamente sobreviventes, porque enfrentamos e passamos por uma própria crise, que é a de maturidade, de crescimento, de estabilidade financeira, como muitas outras startups já tiveram, e logo em seguida a gente entrou na pandemia. Hoje no Brasil a WeWork já é 30% maior do que foi em seu melhor momento.

Mas houve ruptura no modelo de negócio?

 

A empresa vinha superbem. O Brasil é o mercado onde a gente mais tem prédios dedicados. Muitos clientes cancelaram contratos e houve renegociações considerando o baixo uso. Houve mudança de demanda. Empresas que não precisavam mais de contratos fixos, mas necessitavam de espaços para reunir os times uma vez por semana, uma vez por mês. Neste momento a empresa pivota para um modelo que é de pay-per-use. Desde pagar pela hora até ter um passaporte que a gente chama de All Access, de uso ilimitado. Tivemos aderência e teremos cada vez mais demanda. Isso muda a forma como utilizamos os espaços comunitários.

Quais as principais tendências do setor?

Dificilmente as empresas voltarão a trabalhar cinco dias por semana presencialmente, com todos os funcionários. Nossos dados mostram que a maioria adotou o modelo de três dias semanais. E vemos as empresas entendendo que um grande detrator no processo do presencial é o trânsito, é o tempo de deslocamento.

Qual é o propósito de ficar duas horas preso no trânsito todos os dias? Isso não significa que as pessoas não queiram estar juntas

. Usar os espaços por hora, por mês, tem sido corriqueiro. Atualmente o que está se consolidando como um novo formato é: a empresa tem sua sede que, em vez de ter espaço para 1 mil funcionários, terá para 250, com All Access, para trabalhar de qualquer WeWork do mundo, e vai usar esses espaços quando houver um alto propósito. Então, o conceito de trabalho mudou…

Sim. No início do ano, a discussão era qual a política da empresa, e quantos dias presenciais ela precisava dos funcionários. Isso não resolve nada, porque se não tiver um propósito muito claro para todos estarem no escritório seguem sendo dias desperdiçados. Fica sem sentido. Nesse processo, eu brinco que o chefe mandava e o funcionário ia para o escritório. Agora o chefe manda e o funcionário fala: desculpa, eu vou trocar de emprego. Acabou a política de um manda e todos obedecem. Isso faz com que as empresas tenham que desenvolver uma capacidade de escuta que nunca tiveram.

Mas vemos Elon Musk obrigando os funcionários a ir para o escritório. O Google está investindo mais em seus espaços físicos nos EUA…

A verdade é que hoje isso pode mudar toda semana. Hoje a sua política é todo mundo em casa e amanhã vai estar todo mundo surtado, com sua cultura e o seu NPS [Net Promoter Score] derretendo. Só que se você não tem um poder de escuta para entender o que o seu funcionário quer, com uma forma estruturada de medir isso, você vai acabar tentando replicar o modelo da política do ‘todo mundo obedece’ e ninguém vai obedecer. Essa capacidade de escuta eu acho que tem sido um dos grandes desafios da mudança cultural.

Como lidar com essas diferenças?

Existe inclusive um desafio que a gente vai viver, e nós estaremos muito envolvidos nessa discussão regulatória, que é por mudanças na CLT [Consolidação das Leis do Trabalho]. O que acontece com um conjunto de leis supertradicional quando temos três dias trabalhando de casa? Quais os benefícios e obrigações da empregadora? As empresas estão entendendo que todo dia no escritório não rola. Oferecer uma opção de as pessoas não terem que ficar em casa ou no escritório é muito importante, com essa escuta e essa maleabilidade de entender que as políticas mudaram. Eu participo de conselhos e esse assunto virou pauta de tão crítico para a atração de talentos. Antes era um assunto muito tático e hoje virou estratégico, relacionado a engajamento, atuação e retenção.

Qual o papel da tecnologia nas mudanças que estão em curso? Em várias pesquisas que nós fizemos para criar novos produtos, esse medo de pagar por espaços ociosos aparece muito. A tecnologia se mostrou fundamental para duas coisas: para ser a operadora da logística e uma grande coletora de dados. Nosso primeiro momento com os clientes é ensinar como o funcionário está voltando para o escritório.

 

Dificilmente as empresas voltarão a trabalhar cinco dias por semana presencialmente, com todos os funcionários

Quais são os planos da empresa para o Brasil?

O Brasil é grande o suficiente num mercado com as suas peculiaridades. Hoje são oito cidades e 32 prédios. E a expansão no País é necessária. A gente já está com 85% de ocupação. As empresas clientes querem ter sede e também hubs espalhados. Elas querem oferecer isso como um grande benefício para os seus funcionários. E por trás dessa ação, a possibilidade de o funcionário decidir onde vai trabalhar, um anywhere office. Na WeWork, vemos que expandir é muito difícil na hora de fazer uma priorização. Eu vou primeiro para Sorocaba (SP) ou eu vou primeiro pra Salvador (BA)? Todas as pesquisas que a gente fazia eram completamente inconclusivas, porque as pessoas falavam que eram os dois. Temos agora uma demanda de muita capilaridade, e uma necessidade de crescer para muitos lugares com muita velocidade. E eu preciso poder crescer em todos os tickets para realmente poder oferecer isso a qualquer empresa.

No modelo tradicional demoraria tempo e seria muito custoso, certo?

Ou levaria mais de dez anos ou a gente tem que encontrar outra forma de fazer esse trabalho. É aí que pivotamos, ao analisar o mercado de espaços compartilhados. É um mercado que tem a WeWork, uma ou outra grande marca e depois tem um mundo de coworking. Então, quando a gente junta essas duas dinâmicas surge a ideia do Station by WeWork, um marketplace para coworking e espaços de eventos. Por que eu preciso crescer só com espaços meus? E aí teremos uma base de dados, com métricas, para responder qual o impacto do trabalho híbrido na cultura das empresas, nos resultados.

Com uma ocupação de 85% atualmente, esse modelo agrega o mercado e também foi uma necessidade para a WeWork?

O Station nasce muito dessa dor de a gente jogar fora mais de 1 mil leads, seja por preço, seja por falta de espaço. Os planos são ousados. Em três anos podemos dobrar de tamanho em faturamento. Para a gente é muito claro que não somos concorrentes. A WeWork vai continuar tendo o perfil dela, nos grandes centros, na Faria Lima, mas a necessidade de ter essa variação é muito grande. E eu não consigo suprir essa necessidade sozinha. Olhamos uma malha muito complementar.

É muito mais cooperação do que competição. O comportamento vai mudar e o Station vai causar uma disrupção a partir do momento que as pessoas passam a ter essa segurança, em que vão poder ir uma semana antes do Carnaval para Salvador e trabalhar da mesma forma, com estrutura adequada.

Com tudo isso, é possível que a dinâmica do mercado mude?

Nós não temos prédios próprios, nós alugamos. A WeWork sempre foi cliente dos grandes proprietários. Hoje, esses proprietários já estão nos buscando, porque ninguém mais quer assinar contrato de 15 anos com eles. Querem nossa ajuda para pivotar o business de aluguel deles, para aprenderem a fazer essa flexibilidade. E a nossa relação passa a ser de parceria. Em um prédio que sempre tem um andar vazio, o proprietário luta para achar uma empresa exatamente daquele tamanho para preencher.

Por que não transformamos a área em um espaço colaborativo do prédio inteiro, onde todas as outras empresas podem usar? Muitas vezes, o proprietário pode fazer isso, mas por que não fez? Porque ele não está nesse business. As dinâmicas tradicionais do mercado estão sendo redefinidas. 26

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