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Geral Sexta-feira, 30 de Agosto de 2024, 08:59 - A | A

30 de Agosto de 2024, 08h:59 - A | A

Geral / Trabalho escravo

Operação federal resgata 593 pessoas submetidas a trabalho escravo

Dezoito crianças estavam em condições degradantes e sem remuneração



Alex Rodrigues - Repórter da Agência Brasil 

Servidores de seis órgãos públicos que participam da quarta edição da Operação Resgate libertaram 593 pessoas encontradas em condições semelhantes ao trabalho escravo ao longo do último mês. Entre as vítimas, há, ao menos, 18 crianças ou adolescentes submetidos ao trabalho infantil ilegal – 16 delas eram forçadas a realizar serviços em condições degradantes, sem receber qualquer quantia em troca.

Os resgates ocorreram em 11 (AM, DF, GO, MG, MS, MT, PA, PE, RJ, RS e SP) das 27 unidades federativas brasileiras, entre os dias 29 de julho e 28 de agosto. Os maiores números de ocorrências foram registrados em Minas Gerais (292 pessoas libertadas), São Paulo (142), Pernambuco (91) e Distrito Federal (29). Já as atividades econômicas com maior incidência de trabalho escravo foram a agricultura (especificamente os cultivos de cebola, café e alho), a construção civil e serviços (restaurantes, bares e condomínios).

Clínica de reabilitação

Um dos casos que mais chamou a atenção dos fiscais ocorreu em Pernambuco, onde 18 pacientes de uma clínica de reabilitação para dependentes químicos eram submetidos a trabalho forçado. “Todos eram pacientes internados e realizavam as atividades laborais compulsoriamente, como parte do processo de internação”, comentou o coordenador-geral de Fiscalização para Erradicação do Trabalho Análogo ao de Escravo e Tráfico de Pessoas, André Roston, do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), ao apresentar, hoje (29), o balanço preliminar da Operação Resgate IV.

“A clínica tinha 63 internos e simplesmente não tinha nenhum empregado registrado. Toda a mão de obra, todo o funcionamento do estabelecimento era extraído do trabalho forçado de parte dos internos, a título de isso fazer parte da reabilitação”, acrescentou Roston, explicando que os 18 resgatados na clínica realizavam, gratuitamente, de atividades administrativas ao serviço de porteiro, vigilância e preparação de alimentos, entre outros.

Operação Resgate  IV

A Operação Resgate IV, de combate ao trabalho escravo e ao tráfico de pessoas, é resultado do esforço concentrado de seis instituições: Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), Ministério Público do Trabalho (MPT), Ministério Público Federal (MPF), Defensoria Pública da União (DPU), Polícia Federal (PF) e Polícia Rodoviária Federal (PRF).

Este ano, foram libertadas 11,6% mais pessoas do que na edição anterior, de 2023, quando 532 trabalhadores foram resgatados.

A operação também resultou no resgate da pessoa mais idosa já encontrada na condição de escravizada.

Uma senhora de 94 anos de idade foi resgatada em Mato Grosso, na casa de uma família para a qual ela trabalhou por 64 anos, sem salário. Impedida de constituir família e de estudar, ela continuava cuidando da atual patroa, de 90 anos e com Alzheimer.

Segundo o Ministério do Trabalho e Emprego, a trabalhadora poderá permanecer morando na casa onde passou os últimos anos, com todas as despesas pagas pela família da empregadora, que terá de custear inclusive um cuidador de idosos e um salário-mínimo mensal à senhora.

Outro caso de trabalho escravo doméstico foi identificado no estado de São Paulo. Uma mulher, hoje com 58 anos, foi encontrada na casa de uma família para a qual trabalhava desde seus 11 anos de idade. “Ela foi levada para a casa onde passou a trabalhar graças a uma tutela judicial provisória que nunca se tornou definitiva, supostamente para ser integrada em um novo lar, mas passou a trabalhar compulsoriamente, em condições análogas à escravidão, até ser libertada no âmbito da Operação Resgate”, afirmou o coordenador-geral de fiscalização.

Outro aspecto destacado durante a apresentação dos resultados foi a libertação de trabalhadores estrangeiros. Em Anta Gorda (RS), quatro trabalhadores argentinos foram encontrados sem documentos pessoais ou visto para o trabalho, em condições degradantes na extração, corte e carregamento de lenha de eucalipto.

Em Mato Grosso do Sul, as equipes de fiscalização tiveram que usar caminhonetes com tração, lanchas e até um helicóptero para chegar aos dois estabelecimentos onde 13 paraguaios foram flagrados em situação degradante, submetidos à servidão por dívida.

“O isolamento geográfico, a dificuldade de acesso das equipes de fiscalização, contribuem para a vulnerabilização dos trabalhadores”, comentou Roston.

Até o momento, os responsáveis por submeter os trabalhadores a condições semelhantes à escravidão já tiveram que desembolsar mais de R$ 1,91 milhão apenas para saldar verbas rescisórias.

Segundo o coordenador, os órgãos responsáveis seguem buscando o pagamento de outros deveres trabalhistas e custos.

“Este valor total vai ser maior, pois ainda há muitas equipes em campo, realizando as cobranças dos pagamentos. E se não conseguirmos os pagamentos neste ciclo operacional, teremos, eventualmente, a judicialização destas cobranças”, acrescentou o coordenador destacando a importância de punir também financeiramente os responsáveis.

“O principal motor da exploração do trabalho escravo é o fato de que há um grande benefício econômico ao se adotar esta estratégia de violação dos direitos humanos para exploração do trabalho. No cerne, emprega-se o trabalho escravo contemporâneo porque esta ainda é uma conta economicamente benéfica para os exploradores”, concluiu Roston.

 

Em Mato Grosso

Uma idosa de 94 anos foi resgatada em situação de trabalho doméstico análogo à escravidão, após 64 anos trabalhando na casa de uma família, em Cuiabá. A fiscalização foi realizada por auditores-fiscais, Polícia Civil, Polícia Federal, Ministério Público do Trabalho (MPT) e Assistência Social do Município, na terça-feira (20), e divulgada nesta quinta-feira, 29.

A ação foi deflagrada por uma denúncia anônima, que informou que a idosa vivia no local como cuidadora da dona da casa, de 90 anos, adoecida com Alzheimer. Durante a fiscalização, foi possível comprovar os fatos citados na denúncia.

De acordo com a Superintendência Regional do Trabalho de Mato Grosso (SRTE), foi possível constatar que a vítima viveu nas seguintes condições:

 

  Nunca recebeu salário;
  • nunca teve registro em carteira;
  • nunca tirou férias;
  • passava noites acordada ao lado da cama da patroa;
  • encontrava-se em jornada exaustiva.

 

Ainda, segundo a fiscalização, foi retirada da idosa a chance de constituir sua própria família, tanto que a resgatada se refere aos filhos e netos da patroa como se fossem dela. Ela se recusou a sair do local, alegando que não poderia deixar a patroa sozinha, se referindo a ela como irmã.

Após a inspeção no local, os dois filhos da patroa foram notificados para comparecer à SRTE, eles assinaram um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) para lhe assegurar os seguintes direitos:  

  • assegurar à trabalhadora o usufruto vitalício, irretratável, inalienável e incomunicável do imóvel onde vive atualmente;
  • garantir o pagamento vitalício de todas as contas relativas ao imóvel (luz, água, condomínio) em favor da trabalhadora;
  • contratar imediatamente uma cuidadora para o período da noite e manter a do dia para os cuidados com a trabalhadora;
  • garantir o pagamento mensal de um salário mínimo à trabalhadora caso haja a supressão ou extinção do benefício que recebe atualmente; e
  • permitir o acesso aos agentes de assistência social, sem qualquer obstáculo, para acompanhamento do caso.

 

O descumprimento acarretará em aplicação de multa no valor de R$ 20 mil por item descumprido e multa diária de mil reais entre o descumprimento e a regularização.

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