A alienação política decorre não só, mas também, em grande parte, do analfabetismo escolar. Mas existem outros componentes fundamentais como a falta de cultura política, por exemplo. Pode-se se dizer que a grande falha da democracia brasileira é a baixíssima cultura política da maioria do seu povo. A nossa democracia nunca foi o que o nome traduzido do grego nos transmite: governo do povo. O que é cultura política? É um volume de conhecimentos formado por noções, de história, sociologia, matemática, economia, filosofia e outros. Além disso podemos entende-la também como um conjunto de atitudes, normas, crenças e valores políticos partilhados pela maioria dos membros de uma determinada sociedade ou nação.
A ausência desta característica é o fator maior de alienação de uma sociedade que se deixa guiar apenas pelo que dizem os veículos de mídia, os grandes formadores de opinião e finalmente o vizinho que por ter um mínimo de informação a mais, "faz a cabeça" do desavisado. Então, o viés de interesse e o proselitismo de segmentos mais preparados e mais aparelhados da sociedade se sobrepõe ao imenso vazio na cabeça da maioria da população levando a um comportamento de manada.
Os condutores dessa manada a dirigem de acordo com interesses e conveniências subjetivos e circunstanciais. Como cobrar de uma sociedade noções de sociologia, por exemplo, quando uma grande parte dos jovens universitários recém-formados nesse país que deveriam estar com informações na "ponta da língua", mal balbuciam a palavra "política". O que dizer, então, da grande massa de analfabetos funcionais ou de cidadãos comuns que nunca leram um livro, um jornal ou nunca dedicaram um minuto de suas vidas a tentar entender seu lugar no mundo em que vive. Sem uma formação sólida na escola poucos são capazes de progredir no entendimento político.
Segundo a Professora e Mestre por Harvard, Priscila Cruz, a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) divulgou dados recentes sobre a situação da América Latina e do Caribe com relação ao analfabetismo. Dentre os 139 países participantes do levantamento, apenas 39 cumpriram a meta de reduzir o analfabetismo em 50% até 2015. O Brasil está fora destes 39. Só, que saber ler e escrever não basta. Para ser um cidadão pleno é preciso ir além de decifrar os códigos do nosso alfabeto: é preciso ter domínio pleno de habilidades básicas de leitura, escrita e matemática para interpretar o mundo à sua volta. Caso contrário, o indivíduo pode ser considerado analfabeto funcional.
Para medir este tipo de capacidade na população foi criado o INAF (o Índice Nacional de Alfabetismo Funcional). O Inaf é composto por entrevistas e aplicação de teste cognitivo a uma amostra da população brasileira entre 15 e 64 anos de todas as regiões do país, na zona urbana e rural. E olhem os resultados avassaladores do último teste feito em 2016. Ele mostra, por exemplo, que apenas 11% dos entrevistados que eram empresários e empreendedores apresentavam o nível de proficiência mais alto, o que significa que nem mesmo quem chega aos cargos mais elevados pode ser considerado plenamente alfabetizado.
Na economia rural, nos serviços domésticos e na construção civil encontramos as taxas mais altas de analfabetismo funcional: respetivamente, 70%, 42% e 41%. Completa Priscila Cruz: " o custo do analfabetismo é o custo de uma vida plena. É o custo da cidadania, da qualidade de vida e do desenvolvimento do indivíduo, que fica atado à negação de um direito que lhe é inato. É o custo moral de um país. "
Completo eu: como é que um país com as precaríssimas condições de educação, cultura, analfabetismo escolar e funcional como o Brasil quer sair do subdesenvolvimento, do atraso e do anacronismo em que se encontra e que vem só piorando a cada ano que passa? Só há uma saída: doses maciças e urgentes de educação, educação e educação. Isso para termos uma nação de verdade daqui a algumas décadas. Antes, só a democracia meia-boca que se vê desde sempre.
Helio Monti é superintendente da Eletronorte-Gerencia de Obras de MT e Mestre em Economia pela UNB. Contato: e-mail [email protected]