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Artigo Segunda-feira, 16 de Dezembro de 2019, 00:00 - A | A

16 de Dezembro de 2019, 00h:00 - A | A

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Avanço dos evangélicos



Gaudêncio Torquato 

BBB: bancadas do boi, da bala e da bíblia. A sigla é bastante conhecida e tende a ganhar mais fôlego nos próximos tempos. Fiquemos com esta última, começando com a hipótese: a bancada evangélica vai se fortalecer no governo Bolsonaro, na esteira do crescimento do evangelismo no Brasil.
Um conjunto de elementos sinaliza nessa direção: vínculo forte que os evangélicos têm com os valores conservadores, matriz do ideário governamental; grande bancada parlamentar, que soma cerca de 200 deputados e 10 senadores; prestígio que o presidente confere aos evangélicos, frequentando cultos, recebendo bênçãos de pastores. Sua esposa, Michelle, é intérprete de libras nos cultos dominicais da Igreja Batista Atitude, no Rio. Já a cerimônia religiosa da união do casal foi oficiada pelo pastor Silas Malafaia, da Assembleia de Deus.
Que fenômenos explicam a expansão dos evangélicos no território, que hoje se aproximam de 24% da população, enquanto os católicos caem para a faixa dos 62%, de acordo com o IBGE? O que se sabe é que o evangelismo se apresenta como uma entidade viva, tocando diretamente no coração dos fiéis, renovando a liturgia, movimentando plateias, falando de problemas cotidianos e mostrando a trilha para os participantes usufruírem, desde já, os bens terrenos.
Desse modo, a pobreza pode ser revertida por atos e disposição de cada um. Já a Igreja Católica tem na pobreza um dos eixos de sua pregação. Ao tomar posse, o papa Francisco teria dito: como eu gostaria de uma Igreja pobre, para os pobres. A menção aos pobres é referência a São Francisco de Assis, cuja vida foi dedicada à pobreza. O papa escolheu o nome de Francisco para evocar o santo. Sem esquecer que Cristo nasceu numa manjedoura.

Entre as teses sobre o evangelismo, particularmente sobre a vertente pentecostal, movimento de renovação cristã que dá ênfase à união com o Espírito Santo, há um texto interessante do pesquisador Brand Arenari. O foco da mensagem pentecostal é a promessa de integrar indivíduos à dinâmica central da sociedade, o que inclui as noções de inclusão, ascensão social e modelos de vida individuais. Escopo que encontra guarida na Teoria da Prosperidade, pela qual as pessoas podem ter acesso às maravilhas do mundo moderno, aqui e agora. O sofrimento não tem mais valores positivos, encontrados em outras doutrinas, aduz Brand.

Condição para se galgar o edifício da melhoria de vida é o seio familiar. No pentecostalismo, a família assume o papel de um banco de créditos afetivos, morais e cognitivos. Preservar a família é, portanto, um dos eixos do credo, com suas células que acompanham a dinâmica da vida de seus membros. Indivíduos disciplinados, orientados para o estudo e o trabalho, acabam encontrando a receita do sucesso.
Olhemos para os cárceres abarrotados. Quem leva aos presos a mensagem de esperança, de voltar a uma vida saudável, com acesso aos bens materiais, contanto que sigam preceitos e determinadas linhas de comportamento? As igrejas evangélicas. Sob essa crença, presos saem dos cárceres com uma bíblia na mão.
Em suma, a receita do pentecostalismo é não se conformar com a pobreza. Daí o aceno a melhores dias. 

Gaudêncio Torquato é jornalista, professor titular da USP, consultor político e de comunicação Twitter@gaudtorquato

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