Reportagem
Entre agosto de 2022 e julho de 2023, um total de 50.037 hectares (ha) de floresta foi explorado para a extração de madeira no estado do Amazonas, de acordo com o Sistema de Monitoramento da Exploração Madeireira (Simex). O levantamento feito pela iniciativa mostra que, no período, 77% dessa exploração florestal, o equivalente a 38,6 mil ha, ocorreu de forma não autorizada ou sem a devida identificação de legalidade.
Os municípios de Lábrea, Manicoré e Boca do Acre foram os que registraram a maior exploração não autorizada para o intervalo analisado. O Simex utilizou dados do Sistema Compartilhado de Informações Ambientais (SisCOM) para produzir a análise e chegou ao diagnóstico de que, apesar do montante da exploração florestal total (legalizada ou não) identificada no Amazonas ter sido 1% menor que o registrado no período anterior (2021 – 2022, quando a exploração mapeada alcançou 50.448 ha), o avanço da exploração ilegal é preocupante.
“Os dados deste período, 2022 – 2023, apresentam grande diferença em relação ao ano anterior, principalmente pela análise da legalidade. Em números absolutos, os dados do período atual estão bem próximos do total identificado no período anterior, porém ressaltamos que, em 2022-2023, os dados sobre as licenças e a validação dos polígonos enviados ao Ipaam, não foram respondidos até o lançamento deste relatório. Portanto, foram utilizados dados oficiais do SisCOM”, explica Heitor Pinheiro, especialista em geoprocessamento e analista do Idesam.
A partir dos dados do SisCOM, o Simex identificou que os municípios do Amazonas com mais exploração não autorizada foram: Lábrea, com 12,3 mil ha; Manicoré, com 7,2 mil ha; Boca do Acre, com 5,8 mil ha; Pauini, com 3,6 mil ha; Novo Aripuanã, com 2,076 ha e Humaitá, com 1,3 mil ha. A lista atual não traz muitas mudanças, pois, assim como no período anterior, os municípios ao sul do Amazonas se destacam na exploração madeireira do relatório.
Por outro lado, entre os municípios com mais exploração madeireira legalizada estão Silves, com 5,1 mil ha; Itapiranga, com 2,1 mil ha; Lábrea, com 1,5 mil ha; Humaitá, com 1.007; e Novo Aripuanã, com 521 ha. Os dados chamam a atenção quando se considera a análise do mesmo intervalo do período imediatamente anterior (2021 – 2022), quando 91% da exploração madeireira identificada no estado foi realizada de forma autorizada enquanto apenas 9% foram de maneira ilegal.
Pablo Pacheco, consultor do Idesam, destaca que a falta de transparência afeta o acesso ao cenário concreto de informações sobre a exploração madeireira na Amazônia.
“Essa situação representa um desafio significativo, que impacta a auditoria e a fiscalização da exploração madeireira. Essa deficiência pode levar a várias consequências, incluindo a exploração insustentável das florestas, o desmatamento ilegal e a degradação ambiental, além de dificultar a implementação de políticas de manejo florestal sustentável por parte de iniciativas do terceiro setor”, afirma Pacheco.
O diretor-técnico do Idesam, André Vianna, lembra que a exploração ilegal de madeira gera problemas para além da dimensão ambiental. “A exploração ilegal, além dos danos ambientais, gera situações de risco aos trabalhadores e impacto negativo ao mercado”, disse.
Vianna enfatiza que o produto ilegal compete com a madeira licenciada, prejudicando todo o setor, tanto na redução de preço quanto em termos reputacionais, o que dificulta também o acesso a mercados com maiores valores. “A atividade madeireira licenciada é importante para o Estado e a sociedade, pois gera arrecadação de impostos, empregos e movimenta recursos relacionados a sua cadeia. Ainda, permite a manutenção da cobertura florestal e, quando realizado por populações tradicionais, gera renda e proteção dos territórios”, pontua Vianna.
Áreas Protegidas
O Simex também observou que a maior parte da exploração madeireira não autorizada entre 2022 e 2023 foi detectada em Imóveis Rurais Privados com Cadastro Ambiental Rural (CAR), com 30,1 mil ha. O levantamento aponta ainda que 17%, ou 6,4 mil hectares de floresta foram explorados de maneira ilegal em Terras Indígenas (TIs); enquanto 3% (ou 1,1 mil ha) foram em Áreas Não Destinadas e 1% (ou 554 hectares) em Unidades de Conservação (UCs).
Outro ponto de atenção do levantamento diz respeito às TIs na Amazônia, que registraram os maiores índices de exploração ilegal de madeira, somando 6,4 mil ha.
A TI Tenharim Marmelos foi a mais afetada, com 3,4 mil ha de floresta extraídos ilegalmente, seguida pela Kaxarari, com 2,6 mil ha, e pela Jacareúba-Katawixi, com 395 ha. A TI Jacareúba-Katawixi, localizada na área de influência da BR-319, é habitada pelos Isolados do Katawixi, e seu processo de homologação já se arrasta há 17 anos.
No que diz respeito às UCs, os Parques Nacionais (Parna) Mapinguari e dos Campos Amazônicos foram os mais impactados, com 277 hectares explorados ilegalmente em cada um. Essas áreas são de proteção integral, onde é permitida apenas a utilização indireta dos recursos naturais, com o objetivo de preservar a biodiversidade e evitar a degradação dos ecossistemas.
“Para reverter esse quadro, é necessário em âmbito federal o fortalecimento de fiscalizações em Terras Indígenas e Unidades de Conservação Federais, além do fortalecimento de ações conjuntas com o governo do estado, principalmente, ações em campo. Já em âmbito estadual, é necessário o fortalecimento do Ipaam com aportes de recursos para ampliação de quadro técnico e para melhoria estrutural visando maior celeridade para os processos de licenciamento e maior transparência de dados, assim como, é necessário maiores recursos para realização de operações em campo otimizadas pelo uso de ferramentas de sensoriamento remoto”, completa André Vianna, do Idesam.
Formado pela rede de instituições de pesquisa ambiental integrada pelo Imazon, Idesam, Imaflora e ICV, o Simex se baseia em ferramentas de análise geoespacial e inteligência geográfica, utilizando dados da Secretaria de Estado de Meio Ambiente do Amazonas (Sema-AM) e do SisCOM, do Ibama.
No entanto, a falta de atualização do SisCOM e a ausência de dados do Amazonas podem ter gerado inconsistências nos resultados, que foram obtidos analisando extrações madeireiras ocorridas entre agosto de 2022 e julho de 2023.