Jornal Mato Grosso do Norte
Sucena Shkrada Resk
ICV
A mobilização pela transparência do planejamento elétrico brasileiro e pela escuta dos povos atingidos no processo de implementação de projetos de Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs) e de Usinas Hidrelétricas (UHCs) em curso e previstas na Bacia Hidrográfica do Tapajós, localizada nos estados do Amazonas, Pará e Mato Grosso, concentrou debates realizados entre especialistas, indígenas e ribeirinho, nesta semana, em BrasíliaO primeiro encontro aconteceu no Memorial Darcy Ribeiro, na Universidade de Brasília (UnB), no dia 12, e o segundo, em audiência pública promovida pela Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável e pela Frente Parlamentar Ambientalista, na Câmara dos Deputados, no dia 14.
Os eventos também marcaram o lançamento do livro Ocekadi: Hidrelétricas, Conflitos Socioambientais e Resistência na Bacia do Tapajós, que reúne 25 artigos de cerca de 50 autores, em que aspectos antropológicos, de biodiversidade a práticas de licenciamento, entre outras, dão o panorama da complexidade dessas obras e de seus impactos, presentes e previstos, já que são dezenas de empreendimentos programados nesta região, sendo pelo menos 80 de grande porte.
Na língua Munduruku, Ocekadi significa “nosso rio” e traz a mensagem da importância de pertencimento, como destacou Josafá Akay Munduruku, da Aldeia Sai-Cinza, no rio Tapajós.
“Moro no Alto Tapajós, no Pará, e essas obras afetam a gente diretamente. Estamos fazendo mobilizações nas cidades, como a que participamos recentemente 2ª Caravana em Defesa dos Povos do Rio Tapajós, em Itaituba. Várias etnias e ribeirinhos participaram com a gente”, disse.
O indígena define a mobilização como um instrumento para a conservação da biodiversidade e dos direitos dos diferentes povos da Amazônia.
“É por nós, ribeirinhos, agricultores familiares, pescadores e pela conservação de nossa fauna e flora, de nossos peixes e de lugares sagrados. Este patrimônio está sendo impactado…Chega de atropelo aos nossos direitos na Constituição e no artigo 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Nós somos guardiões de nosso planeta e não somos respeitados”.
Josafá citou os impactos já visibilizados pelo empreendimento hidrelétrico de Belo Monte, no município paraense de Altamira. “Aumentaram o número de assaltos, estupros, as portas do comércio fecharam e o desemprego aumentou. Estão também quebrando nossos costumes”.
O indígena Darlisson Peixoto Apiaká, da região da Bacia do Teles Pires, em Mato Grosso, citou a experiência de já ter iniciado a operação da UHC Teles Pires a 180 quilômetros da aldeia e a de São Manoel, há pouco mais de 100 quilômetros. “O nível do rio está cada vez mais baixo, o que diminui a nossa fonte de alimentação que são os peixes e aumenta cada vez mais a quantidade de brancos dentro de nossas aldeias. Com a aliança com os outros povos e atingidos poderemos ter mais força para enfrentar essa pressão. Sem consulta, sem respeito a nossos direitos, como será a vida de nossas crianças e idosos daqui dez anos? Estas usinas, nem sequer levam energia para nossas aldeias, mas para grandes fábricas, como de alumínio”.