Sexta-feira, 21 de Novembro de 2025

Caderno B Sexta-feira, 21 de Novembro de 2025, 10:12 - A | A

21 de Novembro de 2025, 10h:12 - A | A

Caderno B / PERFIL

Camadas de liberdade: “ÂNGELA DINIZ: assassinada e condenada

Marjorie Estiano revive Ângela Diniz em série da HBO Max e mergulha na potência política do prazer feminino



 Márcio Maio TV Press   

              Marjorie Estiano conduz um dos trabalhos mais intensos de sua carreira em “Ângela Diniz: Assassinada e Condenada”, minissérie da HBO Max dirigida por Andrucha Waddington. No centro da trama, inspirada pelo podcast “Praia dos Ossos”, da Rádio Novelo, está a socialite mineira assassinada por Doca Street em 1976, caso que redefiniu o debate sobre feminicídio no Brasil e expôs a violência sustentada pela tese misógina da legítima defesa da honra, declarada inconstitucional pelo STF apenas em 2023. Ao interpretar Ângela, Marjorie não revive apenas uma figura histórica: ela revisita uma mulher que ousou viver de forma plena em um tempo que punia a liberdade feminina. “Interpretar Ângela, uma mulher que se dedica e se autoriza ao prazer, é algo importante e essencial na cultura brasileira”, afirma.          

       A atriz explica que a imersão no universo da personagem atravessou sua vida pessoal. A construção de uma Ângela livre, prazerosa e avessa à moral vigente ativou reflexões profundas sobre seu próprio modo de existir.

Para mim, a vida sempre foi muito trabalho, compromisso, seriedade… Foi uma oportunidade de me experimentar na liberdade, na leveza, no prazer, e isso é muito valioso. É um exercício para a vida inteira”, diz. Ao longo do processo, vieram também os impactos sociais e históricos do feminicídio. “A consciência sobre a batalha pelos direitos das mulheres e sobre a força de uma sociedade machista faz você enxergar melhor sua própria vida e relações”, aponta.                

A atmosfera dos anos 1970 também atravessa a série como linguagem: o glamour dos salões cariocas, o Copacabana Palace, a noite boêmia e a geografia de uma cidade menos congestionada. Tudo reconstruído com minúcias.

Foto/ Divulgação

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É muito trabalhoso, porque está nos detalhes: cada objeto, cada figurante, a música. É muito requinte”, observa. O cuidado inclui ainda o que não se mostra: a cena do assassinato ficou de fora, decisão definida desde o início. “A violência é descrita no julgamento, você não precisa detalhar”, defende a atriz.            

     Além da denúncia histórica, a série celebra a relação entre mulheres, rompendo com narrativas que tradicionalmente opõem personagens femininas. “É muito bonito não colocarem as mulheres competindo, que é um vício da narrativa sobre a mulher”, ressalta Marjorie. O acolhimento, a amizade e a cumplicidade retratadas compõem, para a atriz, um retrato coletivo da força feminina. “Elas permanecem amigas, se amando, se respeitando. É um ato político transformar essas narrativas”, reforça.         

        No centro de tudo está o confronto com uma sociedade que pune mulheres que fogem da norma. E aí, Marjorie vê em Ângela um espelho contundente. “A sociedade é muito hipócrita. Você pode fazer o que quiser, mas tem de parecer daquela maneira. E a Ângela não aceitava esse ‘parecer’. Bateu de frente”, valoriza. P

ara a atriz, o feminicídio exposto na série revela um incômodo causado por uma mulher que não obedeceu à expectativa de submissão. “É uma destituição do poder do homem, que só se ampara na sustentação do que a sociedade determina que ele tem por gênero”, aponta.  

Ângela Diniz: Assassinada e Condenada” – HBO Max.  

Foto/ Divulgação

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Ecos de uma época                

A recriação dos espaços glamourosos do Rio, com festas luxuosas, réveillon cinematográfico e ambientes sofisticados, foi um dos elementos que mais surpreenderam Marjorie. “É um deleite ver séries de um período que não vivemos mais, que nossos pais viveram. É uma viagem na memória”, define.

Por outro lado, o rigor histórico traz limitações: ruas mais vazias, arquitetura preservada e uma cidade que precisava se parecer com a de 50 anos atrás. Tudo isso moldou o clima de uma narrativa que transita entre o deslumbramento e a denúncia.                

A decisão de deslocar o foco do crime para suas implicações também expõe uma postura ética. Sem espetáculo, sem reencenações traumáticas, a minissérie foca no contexto e nas consequências. Uma discussão que ainda segue urgente, mesmo em 2025. Mas, para Marjorie, debater gênero implica também incluir os homens nessa conversa.

Isso é fundamental. Tem a série ‘Adolescência’ (Netflix), que fala muito do lugar do machismo na violência perpetuada inclusive contra o próprio homem. É uma doença da sociedade. Trazer a narrativa e o lugar de fala do homem sobre esse tema é importantíssimo”, afirma.  

Instantâneas

# Marjorie Estiano nasceu em Curitiba e tem 43 anos. # Ela ficou nacionalmente conhecida ao interpretar a vilã Natasha na temporada 2004 de “Malhação”.

# Antes de se consolidar como atriz na tevê, ela foi participante do talent-show “Popstars”, do SBT, que formou o grupo musical feminino Rouge, em 2002.

# Recebeu o prêmio APCA de Melhor Atriz de Televisão em 2018, pela atuação na série “Sob Pressão”, seu primeiro trabalho dirigido por Andrucha Waddington.

 

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