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Opinião Segunda-feira, 04 de Setembro de 2017, 00:00 - A | A

04 de Setembro de 2017, 00h:00 - A | A

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Duas realidades



Em 2004, houve um desmatamento de 28.000 km² de floresta na Amazônia. De lá para cá, houve um recuo de 80% no ritmo anual de derrubada da floresta até 2015, quando então cresceu 24%. Em 2016 mais um avanço de 28%, com quase 8.000 km² desmatados, indicando talvez o começo de uma tendência ascendente. 
Em relação a 2014, a derrubada de 2016 mostra aumento de 60%. Mais de um terço ocorreu em terras públicas não destinadas (25%) e áreas protegidas (12%); também em áreas privadas (35%) e assentamentos (28%). Mas não é tão simples assim. Por trás desses números se escondem histórias de grilagem de terras públicas, invasão de áreas privadas, extração ilegal, registros falsos, confrontos armados com a fiscalização. Verdadeiros casos de polícia.
E o argumento de que o desmatamento é fator de progresso econômico na região parece não se sustentar muito, segundo dados do Ipam e Imazon¹. Eles mostram que entre 2004 e 2015 o PIB agrícola da Amazônia cresceu de R$ 15 bilhões para R$ 50 bilhões, enquanto a derrubada anual caiu de 28.000 km² (pico histórico) para 7.000 km². Antes disso, o ritmo da derrubada era maior do que a evolução do PIB agrícola. 
Como contraponto à pirataria florestal, observa-se na região o crescimento gradual de sistemas agroflorestais tecnificados (em assentamentos ou operações de maior escala), que melhoram progressivamente seus resultados de produtividade e manejo adequado da floresta. Ainda são poucos, mas representam um rompimento com o modelo de desmatamento e criação extensiva, que se esgota em poucos anos e deixa um saldo de solo degradado.
Enquanto isso, a Embrapa Monitoramento por Satélite divulgou em junho um estudo de dados geocodificados do Cadastro Ambiental Rural (CAR)², analisando o impacto da agricultura no meio ambiente, em quase 4 milhões de imóveis rurais cadastrados até dezembro de 2016, em 5.570 municípios. Eles representam 400 milhões de ha e neles foram detectados 170 milhões de ha de vegetação nativa preservada dentro dos imóveis, entre áreas de preservação permanente e reservas legais.
As análises da Embrapa mostram que, no seu conjunto, “os produtores preservam em vegetação nativa uma parcela dos imóveis superior à exigida pelo Código Florestal, que é de no mínimo 20%”. Nas áreas agrícolas do Sul, os agricultores preservam em média 26% das terras, no Sudeste 29% e no Centro-Oeste 49%. São duas realidades bem distintas nessa questão ambiental. 

De um lado, a surpresa dos estudos da Embrapa, mostrando que estigmatizar a agricultura como vilã da preservação da vegetação nativa pode não ter fundamento. Desrespeitos às regras ambientais pelo país afora serão encontrados, certamente. Mas essa não parece ser a regra. Ao contrário, do ponto de vista da legislação ambiental o agricultor – no seu conjunto – parece estar com saldo positivo.
Já na Amazônia, o desafio ainda é a recorrente pirataria florestal, que acaba sempre virando manchete da mídia internacional. Contra ela a solução parece que passa principalmente pelo fortalecimento de políticas públicas de controle, que estão fragilizadas nesse Brasil de crise e cofres públicos esgotados. Requer também um estímulo maior à reconfiguração tecnológica do agro regional e, talvez, até a criação de incentivos econômicos à proteção do ambiente, pagando por benefícios ecossistêmicos e tornando a preservação mais rentável do que a derrubada predatória da floresta. Tudo isso, é claro, caminhando junto.

Coriolano Xavier é Vice-Presidente de Comunicação do Conselho Científico Agro Sustentável (CCAS) e Professor do Núcleo de Estudos do Agronegócio da ESPM.

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