POR GERALDO BESSA
TV PRESS
Com mais de 40 peças no currículo, Michel Blois estava tão feliz emendando projetos no teatro que não tinha muitos olhos para outros veículos. A paralisação dos espetáculos por conta da pandemia, entretanto, acabou fazendo o ator olhar com mais carinho para a tevê. A convite do produtor de elenco Fábio Zambroni, a estreia no vídeo não poderia ter sido mais especial e significativa ao viver o oprimido Leopoldo de “Além da Ilusão”. Na trama, o personagem é gerente da Rádio Estrela de Campos e, em plenos anos 1940, tenta a todo custo disfarçar sua sexualidade para não sofrer as consequências de ser gay em uma época onde não havia qualquer respeito ou direitos para a comunidade LGBTQIAP+. “Sempre fui muito noveleiro e estou muito feliz com essa primeira experiência em folhetins. Fui muito bem recebido pela equipe e acho o Leopoldo um personagem com muitas nuances, que ocupa vários lugares na comédia e no drama que se desenvolvem na história”, valoriza.
Assim que leu o roteiro, Michel logo se sentiu muito próximo das complexidades de Leopoldo. Casado com o também ator Pedroca Monteiro há 11 anos, Michel sofreu toda a opressão possível na infância por conta de sua orientação sexual. As lembranças dessa época foram de fundamental importância para a construção das cenas de “Além da Ilusão” onde Leopoldo é humilhado e chantageado ao demonstrar interesse por outros homens. “A violência é diária. Quando criança, não era convidado para os aniversários dos meninos, era excluído das conversas, já tomei chutes, socos e fui muito xingado. Cresci com esse terror de ser gay. Pensava que seria assim para sempre e o teatro me salvou. Nos palcos, encontrei a força que eu precisava para ser quem eu realmente sou. Recorri a essas memórias tristes e à superação delas, para interpretar o Leopoldo”, entrega.
Apesar do sofrimento, a visão atualizada da autora Alessandra Poggi também reserva ao personagem momentos de comédia e romance. A relação escondida entre Leopoldo e o galã de radionovelas Plínio, de Nikolas Antunes, foi surgindo lentamente e agora já conta com a torcida do público. Até bem pouco tempo atrás, relações homoafetivas não eram sequer desenvolvidas na faixa das seis. Por isso, Michel celebra a ousadia e a liberdade artística que pautam o trabalho em “Além da Ilusão”. “A trama é de época, mas o olhar é de agora. O texto tem diversos assuntos espinhosos que ainda insistem em se fazer presentes na sociedade de hoje”, ressalta. Além de atuar, Michel é um assíduo telespectador da atual trama das 18h. O hábito de assistir começou durante a preparação para o personagem e, mesmo com a agenda apertada, ele não perde um capítulo da trama, onde aproveita para acompanhar a história e ver onde pode melhorar. “Entrei na história apenas na segunda fase. Fui ver os primeiros capítulos para me inteirar sobre a novela e fiquei viciado. É muito bom participar de algo que realmente me prende como público”, elogia.
Gaúcho de Rio Grande, Michel tinha 16 anos quando resolveu se mudar para o Rio de Janeiro. Na capital carioca, passou pelo prestigiado Tablado e se formou na Casa das Artes de Laranjeiras. Nos palcos, ele definitivamente sentiu que tinha encontrado não apenas sua vocação, mas sua tribo. “Já fiz de tudo um pouco no teatro. Fui produtor por muitos anos, escrevi textos, dirigi peças e também fundei a companhia Pequena Orquestra. Além disso, foi onde conheci meu marido e fiz meus melhores amigos”, detalha. Aos 39 anos, ele admite que estar no palco ainda é a prioridade de sua carreira. Porém, as peças agora terão de dividir sua atenção com os projetos televisivos. Apesar da rotina cansativa e estressante que envolve uma novela, Michel encarou a novidade com leveza e se divertiu bastante nos bastidores de “Além da Ilusão”. “Eu tinha a impressão de que tudo poderia ser muito mecânico na tevê. O que encontrei foi espaço para criar e aprender. A troca profissional foi incrível e com certeza quero fazer mais coisas no vídeo”, avisa.
“Além da Ilusão” - Globo - de segunda a sábado, às 18h20.