POR LUANA BORGES
TV PRESS
João Vicente de Castro não tem a menor dúvida. “Espelho da Vida” é o trabalho mais difícil que já fez em sua trajetória. Motivos para isso não faltam. A começar, pelo perfil de seu personagem, Alain. Logo de cara, o ator assumiu a tarefa de dar vida a um protagonista que de bom moço não tinha nada. Confuso e brigão, Alain parecia muitas vezes ter um pé na vilania. Foi preciso calma e cuidado para construir um tipo carregado de humanidade, que cometia erros e acertos, mas que possuía uma boa índole. Isso ficou ainda mais claro quando João começou a aparecer na fase ambientada no início do Século XX na pele de Gustavo Bruno, a versão da vida passada de seu personagem, coberto de más intenções e com claras motivações para a vilania. “Foi difícil fazer o herói que tinha a possibilidade de ter uma rejeição do público muito grande por estar sempre em conflito com a mocinha. Mas as pessoas entenderam a competência do texto de Elizabeth Jhin. Acho que a humanidade dele pegou o público de alguma forma”, constata.
De uns tempos para cá, João resolveu reativar sua conta no Twitter. Desde que fez isso, passou a notar que muitas pessoas torciam para Alain. E principalmente, para que o personagem tenha um final feliz ao lado de Cris, protagonista interpretada por Vitória Strada. “Foi uma surpresa! Acho que isso é competência nossa, do nosso trabalho, que a gente fez com muita paixão. Se depender da internet, Alain e Cris terminam a novela juntos”, pontua ele, que divide seu tempo entre as gravações da novela e do “Papo de Segunda”, programa que apresenta ao lado de Fábio Porchat, Emicida e Francisco Bosco no GNT.
P – Você interpreta dois personagens diferentes em “Espelho da Vida”, mas que “compartilham” a mesma alma em períodos distintos. Como você estabeleceu essas diferenças entre Alain, que faz parte da história no tempo presente, e Gustavo Bruno, que vive no início do Século XX?
R – Alain é um cara cheio de erros e acertos, mas tem bom caráter. O Gustavo deixa essa ética para trás para conseguir o que quer. Ele é um vilão mais claro. O Alain não é vilão de jeito nenhum, mas é um sujeito cheio de erros e acertos. A dificuldade de fazer um e outro é você saber com muita rigidez a diferença dos dois e não magoar esses pontos de diferenciação que você estabelece: jeito de se mexer, tom de voz, jeito de falar e comportamento.
P – Você fez algum estudo específico para conseguir interpretar dois tipos opostos, mas que possuem uma conexão?
R – Não tem estudo, não. É uma coisa que você deita na cama e começa a pensar. Mas foi muito a partir do Alain, do que ele não tem e o que não faz. O Alain tem o corpo mais solto, então fiz o Gustavo com o corpo mais preciso, duro. O Alain fala mais como nós falamos, o Gustavo fala mais pausadamente, como se falava na época, com o português mais formal. A postura do Alain é mais para dentro e a do Gustavo é com o peito mais para fora. A gente tem uma equipe muito boa e que me ajuda muito a não deslocar um personagem do outro.
P – Na trama, um ponto de virada do Alain foi quando ele se aproximou da filha. Como você enxergou esse momento dentro da história do personagem?
R – Acho que tudo faz parte da evolução do Alain após o acidente que sofreu. Ele foi encaixando algumas peças da vida. O reconhecimento da paternidade ajudou muito ele a se humanizar, a de alguma forma entrar em contato com uma fragilidade, uma delicadeza, com o passado. Tudo isso foi ajudando o Alain a se tornar uma pessoa mais doce.
P – No início de “Espelho da Vida”, Alain recebeu críticas do público por não ser um personagem carismático, apesar de estar na função de protagonista. Como você lidou com isso?
R – Doía um pouco quando falavam: “esse cara é muito chato”. Mas você precisa ter esse distanciamento. É difícil. Por isso que falam que o ator está defendendo o personagem. Eu consegui, por mérito do Pedro Vasconcellos (diretor), não defender o Alain, não botar um carinho a mais onde não tinha. Porque você quer achar um carisma em algum lugar. O grande desafio foi entender que eu iria tomar porrada, mas que, se eu apanhasse, significaria que estaria tendo um bom resultado no trabalho que a autora e o diretor estavam me pedindo para fazer. Mas, de repente, as pessoas foram entendendo o Alain.
P – A sua visão em relação ao Espiritismo mudou desde que você começou a atuar em “Espelho da Vida”?
R – Digamos que me fez torcer pelo Espiritismo. Eu sou uma pessoa que acredita em um monte de coisas, mas não sou um cara de muita fé é uma coisa que eu gostaria de ter mais. A ideia da não finitude me agrada muito. Meu padrasto tem 80 anos e, outro dia, ele falou que sempre foi muito cético, mas, estando mais perto da morte, começa a querer acreditar que não acaba aqui. Eu gostaria que não acabasse aqui, se eu pudesse escolher.
“Espelho da Vida” – Globo – De segunda a domingo, às 18h15.